10 de mai. de 2010

Afrika Bambaataa protagoniza noite histórica em Peixinhos

Texto Juliana Lima
Fotos Cleiton Carbonel

Não é por acaso que as coisas acontecem. Mas quando o universo conspira ao seu favor tudo dá certo. Foi mais ou menos isso que aconteceu na última quarta-feira (21/04), dia marcado pela visita do DJ Afrika Bambaataa ao bairro de Peixinhos, em um evento que até o domingo ninguém imaginava que aconteceria, mas aconteceu.Realizado de última hora, sem nenhuma divulgação, tudo feito boca a boca e na raça mesmo. O resultado foi um show histórico, e de graça, mas para uma pequena parcela da comunidade e para poucos que ficaram sabendo em cima da hora (como essa moça que vos escreve).

Peixinhos é um bairro pobre da periferia recifense, vítima da má distribuição de renda que assola o nosso país, mas rico em cultura e em pessoas trabalhadoras. Rico também na luta contra a violência através da arte. É berço de bandas como Nação Zumbi, Lamento Negro, Via Sat, Etnia, Ataque Suicida, entre tantas outras. Sem falar nos músicos, como Toca Ogam, que estão espalhados pelo mundo. O DJ Afrika Bambaataa, reconhecido como fundador oficial do Hip Hop, foi parar em uma das comunidades de maior efervescência cultural da cidade graças à iniciativa de pessoas como Herrysson Moura, morador do bairro e ativista do Movimento Soul Peixe. Há cerca de 40 dias Moura já havia iniciado uma articulação com a Prefeitura da cidade do Recife, mas só recebeu a confirmação do apoio dois dias antes. Então foi hora de correr e juntar os parceiros. Na empreitada ele também contou com o apoio da Associação Metropolitana de Hip Hop, o selo Imbolada Records e a Produtora Favela Music, agenciadora dos shows do Afrika no Brasil.

A Favela Music também está servindo como ponte entre Bambaataa e o movimento hip hop local. A intenção é a criação de uma “filial” da Zulu Nation, ONG de atuação internacional fundada pelo DJ, que tem como princípio as bases do hip hop: paz, amor, união e diversão. Alguns passos importantes já haviam sido dados, desde 2003 a instituição reconhece o coletivo Êxito de Rua como representando local das suas ações. “As ações da Zulu Nation são realizadas nas escolas, através da arte e das palestras de cunho social, mas aqui no Brasil ela é mais espiritual, seguimos uma hierarquia e os mandamentos da Zulu”, esclarece Galo, grafiteiro e um dos fundadores do Êxito.

O show atrasou bastante, mas pra quem esperou a vida inteira pra ver o seu ídolo, o que são três ou quatro horas? O tempo valeu pra reencontrar velhos amigos e colocar o papo em dia. A primeira atração, o rapper pernambucano Tiger (ex Faces do Subúrbio), marcada a princípio para começar às 16h, só subiu ao palco por volta das 19h. acompanhado do MC Cínico, fez o show do seu primeiro CD solo, Poder simbólico, mostrando poesia, elemento cérebro do hip hop. Em seguida foi à vez do DJ Big comandar as pick ups enquanto B-boys e B-girl mostravam toda a ginga e malemolência do breackdance, com coreografias inspiradas em James Brown, na robótica e em atitudes cotidianas. Lá fora, os grafiteiros exibiam seus talentos, representando a evolução da pixação. E os muros do Nascedouro ganhavam em cores uma nova linguagem visual através do grafite, mais um elemento do Hip hop.

Não demorou muito para o Combo Percussivo subir ao palco. O grupo foi formado a partir de um projeto de Naná Vasconcelos na comunidade e hoje é liderado pelo percussionista da Nação Zumbi Gilmar Bola 8, agregando Da lua, também integrante da NZ, Canhoto, Fequinho (Etnia), Samuel (Via Sat), Nego Nido - que desenvolve um projeto autoral de misturas bem convincentes da música negra-, e mais uma pá de gente boa e cheia de ritmo, que o papa do hip hop filmou e fez questão de dividir o microfone em uma das Jam sessions mais esperadas da vida desses músicos, cantando os refrões de seus sucessos e soltando vários improvisos acompanhados de tambores, caixas, abês e ganzás. “O Afrika é a maior referência da música que faço hoje” dispara Gilmar, ainda sem acreditar que conseguiu realizar um sonho e ter protagonizado junto com seus amigos o momento mais especial da noite.

Afrika e a Combo percussivo juntos no mesmo palco


Após a surpreendente apresentação do Combo, o balé afro Magê Molê, formado só por meninas, deixou a platéia impressionada com mais uma bela performance. Depois só restava o Afrika subir novamente ao palco e comandar as pick ups, num show muito mais instigado do que o do Abril pro Rock, completando o último e principal elemento do hip hop, a música. Escolhendo as batidas e misturando os sons deu oportunidade dos rappers Zé Brow, Don Pablo (Víruz) e Spider (Incógnita Rap), um por um soltarem seus improvisos enriquecendo ainda mais a noite.

Novamente b-boys e b-girls em ação até o final do show. Salve!